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nov 11 2013
É preciso punir crimes do Estado contra cidadãos
Ex-integrante da Comissão da Verdade do Peru, a socióloga Sofía Macher defende que o Brasil volte a discutir a revisão da Lei da Anistia, que protege agentes da ditadura militar (1964-85) acusados de torturas e desaparecimentos.
Ela elogia a existência da comissão brasileira, mas diz que o órgão não pode se limitar a fazer reuniões fechadas e preparar um relatório final “que ninguém vai ler”.
A socióloga diz que o Brasil deve cumprir a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos que determinou a revisão da Anistia, em 2010. Ela critica a decisão do Supremo Tribunal Federal que manteve, meses antes, a validade da lei de 1979.
No Peru, cerca de 69 mil pessoas morreram em duas décadas de conflitos, entre 1980 e 2000. A Comissão da Verdade funcionou de 2001 a 2003 e abriu caminho para a condenação de centenas de militares e guerrilheiros do Sendero Luminoso.
Macher passou os últimos dias no Rio para trocar experiências com ativistas da área de direitos humanos.
Folha – Qual é a sua avaliação sobre o trabalho da Comissão da Verdade no Brasil?
Sofía Macher – É muito interessante o processo que levou à criação da comissão para rever os anos da ditadura. É uma oportunidade de olhar para trás e examinar os trechos da história oficial que precisam ser reescritos.
O grande desafio da comissão é envolver a sociedade numa reflexão honesta sobre o que aconteceu no país. Se ela ficar entre quatro paredes, produzindo um relatório final que ninguém vai ler, será um grande desperdício.
Estou convencida, pela experiência do Peru, de que uma revisão honesta da história ajuda a construir e a consolidar a democracia.
Em 2010, o STF manteve a validade da Anistia. O Brasil deve reabrir essa discussão?
Acho que a Justiça deve valer para todos. Por isso, não acredito nas anistias. A Comissão da Verdade pode abrir caminhos e significar um ponto de ruptura, por mais que não termine em processos judiciais.
O Peru também teve uma Lei de Anistia, aprovada no governo Alberto Fujimori, em 1995. No entanto, a lei foi revogada pela Suprema Corte.
O processo é maior que a comissão. O Chile levou oito anos, após o fim da sua comissão, até os militares se comprometerem a dizer onde enterraram os desaparecidos.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos ordenou, em sentença sobre a Guerrilha do Araguaia, que a Anistia seja revista. Isso deve prevalecer sobre a decisão STF?
O Brasil assinou a Convenção Americana de Direitos Humanos e é obrigado a cumprir as sentenças da Corte. A mim parece assombroso que isso não esteja ocorrendo.
Os Estados que adotam esse comportamento debilitam o sistema interamericano. Isso gera um dano tremendo para toda a sociedade.
Hoje, se a Justiça do seu país é injusta, não respeita o devido processo legal, você tem a quem recorrer. Se outros países ignorarem as sentenças da Corte, como o Brasil, todo o sistema interamericano de direitos humanos ficará debilitado.
O Brasil é um país grande e poderoso. Se ele não respeita o sistema, fica a imagem de que a Justiça só vale para os países pobres. Isso me parece terrível, muito negativo.
Os defensores da Lei da Anistia argumentam que ela valeu para os dois lados e contribuiu para a reconciliação no Brasil.
É um argumento válido quando se assina um acordo de paz, quando você tem dois grupos armados e a Anistia é a forma de se pacificar o país. Mesmo assim, não deve valer para crimes de lesa-humanidade. Não acredito que seja válida uma Anistia irrestrita.
É preciso punir crimes cometidos pelo Estado contra cidadãos. Se você diz à sociedade que não vai punir quem cometeu esses crimes, deixa uma mensagem muito ruim.
A Corte Interamericana considera que esse tipo de Anistia é contrário à proteção dos direitos humanos.
Fonte- Folha de S. Paulo
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nov 11 2013
Últimas Vagas para acampamento no FMDH
Atenção! As pré-inscrições para o Acampamentos#FMDH foram prorrogadas até preenchimento total das vagas. São oferecidas 600 vagas para barracas de dois lugares. Garanta já o seu lugar! Últimas vagas!
O acampamento será montado no Pavilhão do Parque da Cidade Sarah Kubitscheck (Brasília-DF), no período de 9 a 14 de dezembro.
Os participantes do FMDH interessados em se hospedar no acampamento deverão contribuir com o valor de R$55,00 – o que lhes dará o direito de ocupar uma vaga de 2x2m, ou o correspondente a uma barraca para duas pessoas. O valor será o mesmo, não importando a quantidade de dias de permanência.
Para garantir uma vaga no acampamento, é necessário realizar a pré-inscrição através do formulário individual. A partir do preenchimento do formulário, um boleto para pagamento é gerado. Mas, atenção! O envio do boleto não é automático. Você precisará aguardar. Recebido o boleto no e-mail cadastrado e sendo efetuado o pagamento até a data de vencimento estará confirmada a sua adesão ao Acampamento do FMDH.
Grupos
Além da inscrição individual, é possível realizar a inscrição para grupos. O pagamento da taxa de adesão deverá ser feita por meio de boleto bancário e o valor será o correspondente ao número de pessoas informado no campo “Quantidade de espaços”. Por exemplo: 10 espaços = R$ 550,00.
Ao acessar o formulário para grupos, no campo “Quantidade de espaços” informe a quantidade de espaços que o grupo precisa, lembrando que 1 (um) espaço pode comportar 1 (uma) barraca para até 2 (duas) pessoas.
O FMDH disponibilizará transporte gratuito do Acampamento para o local do evento, na ida e na volta das atividades. Os horários dos ônibus serão divulgados no primeiro dia de acampamento.
INFORMAÇÕES: fmdh.fes@sdh.gov.br (61) 2025 9071.
Confira as regras:
REGRAS DO ACAMPAMENTO
1. A vaga só será garantida mediante o pagamento do boleto bancário até o seu vencimento.
2. A capacidade máxima de cada é de até 2 pessoas por barraca;
3. O Período de Hospedagem é das 9h de 9 de dezembro às 12h de 14 de dezembro de 2013.
4. É de responsabilidade do Hóspede:
4.1 Fazer o pagamento antecipado de sua inscrição;
4.3 Trazer barraca de no máximo 2×2 ;
4.4 Trazer toalha de banho, lençol, Cobertor, travesseiro, colchonete ou saco de dormir;
4.5 Cuidar dos seus pertences pessoais. A organização do Acampamento não se responsabiliza por objetos pessoais deixados no interior das barracas;
4.6 Custear sua alimentação.
5. É de Responsabilidade dos organizadores do Acampamento:
5.2 Limpar as áreas comuns (passarelas, banheiros, chuveiros…);
5.3 Fornecer segurança patrimonial;
5.4 Permitir o acesso ao acampamento apenas de pessoas credenciadas;
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nov 11 2013
Divulgado nomes de conferencistas e debatedores do FMDH
O Comitê Organizador do Fórum Mundial de Direitos Humanos (FMDH) divulgou alguns nomes de conferencistas e debatedores que participarão do FMDH, entre 10 e 13 de dezembro, em Brasília. Ao todo, já foram confirmados 21 nomes.
Clique aqui para acessar a lista dos nomes confirmados.
Serão realizadas três conferências durante o Fórum: “Direitos Humanos como Bandeira de Luta dos Povos”, “A Universalização de Direitos Humanos em um Contexto” e “A transversalidade dos Direitos humanos”.
A Conferência sobre “Direitos Humanos como Bandeira de Luta dos Povos” vai acontecer no dia 11 de dezembro. Para esse dia, está confirmada a debatedora Sara Victoria Alvarado, da Colômbia, que falará sobre “Direitos Humanos e Mobilização Social”; e os debatedores Tariq Ali, do Paquistão, Tonico Benites e Ela Wiecko Vokmer de Castilho, ambos do Brasil, que discutirão o tema “Reconhecimento e Direitos Humanos”. Sobre “Direito à Memória, Verdade e Justiça”, foram selecionados os seguintes debatedores: Baltasar Garzón, da Espanha, Julián Froidevaux, Argentina, e Rosa Maria Cardoso da Cunha, do Brasil.
A segunda Conferência trata sobre “A Universalização de Direitos Humanos em um Contexto de Vulnerabilidades”, que será realizada no dia 12 de dezembro, e contará com a presença dos conferencistas Leonardo Boff, do Brasil, e Hawa Abdi, da Somália. A programação ainda inclui três mesas de debates neste dia. Para o debate sobre “A Conquista de Direitos por Grupos Vulnerabilizados e a Democracia” estão confirmados Farzana Bari (Paquistão), Wanderlino Nogueira Neto (Brasil) e Amaranta Gómez Regalado (México). A mesa de debate sobre “Os Direitos humanos no Mundo do Trabalho” terá a presença de João Pedro Stédile e Leonardo Sakamoto, ambos do Brasil.
Para a programação do dia 13 e último dia do FMDH está prevista a conferência sobre “Transversalidade dos Direitos Humanos”. Participarão do debate sobre “Defesa dos Direitos Humanos e o Enfrentamento às Violências”, Alejo Vargas Velásquez (Colômbia) e Roberto de Figueiredo Caldas (Brasil). Já a mesa “Por uma Cultura de Direitos Humanos” contará com Alicia Cabezudo (Argentina) e Emir Sader (Brasil). E estarão no último debate, “Comunicação e Direitos Humanos” Frank de La Rue (Guatemala), Maria Pía Matta (Chile) e Catalina Botero (Colômbia).
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nov 06 2013
Comitê Memória, Verdade e Justiça em Cascavel
Esta sendo criado em Cascavel, no Oeste do Paraná, o Comitê Memória, Verdade e Justiça, numa articulação de militantes de Cascavel, Marechal Candido Rondon, Toledo e Foz do Iguaçu. A região foi palco de intensa repressão, primeiro aos trabalhistas (Grupos dos 11), depois aos comunistas e algumas tentativas de resistência armada. Na região Oeste d
o Paraná caiu a tentativa de “implantação” do foco guerrilheiro do MR8 e a Área Tática da VAR Palmares.
Fonte- Fórum Verdade
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nov 06 2013
“Intercambiando experiências sobre Comissões da Verdade”, por Rosa Cardoso
A ditadura militar brasileira, que teve forte participação de elites civis, foi imposta a partir de março de 1964. Contudo, somente em 2011, quarenta e sete anos depois, foi criada nossa Comissão Nacional da Verdade. Um ano após, em 16 de maio de 2012, a comissão foi instalada.

Rosa Cardoso foi a quarta coordenadora da CNV, entre maio e agosto de 2013.
Comparando-se ou não nossa ditadura com outras latino-americanas instauradas na última metade do século, é oportuno perguntar porque a Comissão Nacional brasileira surgiu tão tardiamente.
Observadores da cena política nacional têm constatado que no Brasil persiste uma cultura de conciliação entre as elites e, simultaneamente, de violência e ressentimento com os subordinados. Nossa abertura democrática foi pactuada entre os militares e elites partidárias consideradas pelos mesmos confiáveis, na perspectiva da implantação de uma democracia administrada. É certo que a campanha por eleições diretas, a Constituição de 1988 e outras lutas populares e partidárias frustraram o modelo a ser imposto. Antes disto, entretanto, os militares, articulados com a mais alta corte judicial do país, o Supremo Tribunal Federal, fizeram aprovar uma lei de auto anistia, vigente até o presente.
Além da cultura de conciliação, a extrema desigualdade da sociedade brasileira, (que tem importante raiz no analfabetismo de nossa população, em especial no analfabetismo dos negros e do Brasil do Norte/Nordeste), excluiu do debate dos direitos civis e das graves violações de direitos humanos uma extensa camada de pobres e miseráveis, que por si ou por seus representantes, afirmava-se mais preocupada com reivindicações materiais relacionadas à sobrevivência.
Registre-se que as imensas desigualdades sociais são a marca da sociedade brasileira: em 1989 o Banco Mundial informava que o Brasil era o país mais desigual do mundo, utilizando-se o índice de Gini. Em 2012, no ano passado, ainda era o terceiro mais desigual. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA a desigualdade cresceu entre 1990 e 1998, exatamente quando estava em curso a fase inicial de nossa transição para um regime democrático e seria relevante a constituição de uma Comissão Nacional da Verdade.
Neste momento de nossa transição para a democracia o Brasil exibiu baixas taxas de crescimento econômico, inflação exasperada, retração da indústria e políticas que determinaram desemprego para a classe trabalhadora. Foram implementados planos econômicos como o Cruzado(1986), o Collor(1990), o Real(1994), abriu-se a economia ao mercado externo, realizou-se uma reforma do aparelho do Estado, houve privatizações de empresas etc. Nesta conjuntura a discussão sobre direitos humanos e graves violações foi também adiada pelas elites e pela sociedade civil.
A Comissão
Instalada em 16 de maio de 2012 pela Presidente Dilma Roussef a Comissão Nacional da Verdade teve, primordialmente, como força propulsora a vontade e a reivindicação de vítimas e familiares, que tenaz e incansavelmente, promoveram a luta para encontrar os despojos de seus mortos e desaparecidos, bem como esclarecer e denunciar a autoria e as circunstâncias das graves violações que sofreram.
Seguidamente, houve a necessidade de o Estado brasileiro, inserido numa estrutura de cooperação internacional e regional, visando segurança, desenvolvimento, progresso e paz, cumprir as regras ditadas pelo direito humanitário internacional e pelo direito internacional dos direitos humanos, ao qual o Brasil aderiu por meio de diferentes tratados internacionais e interamericanos. Mediante esta adesão reconheceria, então, o direito a uma justiça de transição e, especificamente, o direito à verdade.
Apesar de ser vítima e sobrevivente de nossa última ditadura a Presidente moveu-se pragmaticamente ao instalar a CNV: reconheceu que a normativa internacional a obrigava a materializar no país o direito à verdade e que a correlação de forças políticas permitia, em 2012, a constituição de uma Comissão Nacional da Verdade.
A Comissão da Verdade brasileira resulta de um processo internacional de judicialização das políticas de transição de regime, onde cortes internacionais afirmaram reiteradamente os direitos à memória, à verdade, à reparação e à justiça das vítimas de graves violações de direitos humanos, bem como o direito das próprias sociedades de constituírem estas políticas de transição.
Na América Latina a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem tido um papel proeminente com o ajuizamento de diferentes casos e, entre eles, o caso Gomes Lund x Brasil, no qual vinte e dois familiares de desaparecidos políticos solicitaram que se julgasse e condenasse o Estado Brasileiro a prestar contas sobre o desaparecimento de 70 vítimas de sua ação repressiva, na designada guerrilha do Araguaia, e a punir os agentes envolvidos na ação.
Em 24 de novembro de 2010 o Estado Brasileiro foi condenado pelo caso Gomes Lund, conhecido como o caso do Araguaia. Na sentença a Corte determinou não somente a busca dos desaparecidos, ou de seus restos mortais, a publicação de informações e o julgamento dos responsáveis pelos crimes de lesa-humanidade cometidos, mas também idênticas providências em relação a todas as graves violações de direitos humanos ocorridas durante o regime militar.
São, ainda, antecedentes relevantes na instalação de nossa Comissão da Verdade as discussões, planos e comissões reivindicadas pela ação das vítimas, familiares e militantes de direitos humanos no âmbito do Governo brasileiro e, particularmente, de seu Ministério da Justiça e da Secretaria de Direitos Humanos. Entre estes se destacam a elaboração do 3º Plano Nacional de Direitos Humanos (2009), a Comissão Especial para Mortos e Desaparecidos (Lei 9.140/95) e a Comissão da Anistia (Lei 10.559/2002).
Contudo, o mais importante antecedente da CNV foi o Projeto Brasil: Nunca Mais.
O Projeto Brasil: Nunca Mais foi idealizado e executado, clandestinamente, por representantes da alta hierarquia das religiões Católica, Protestante e Judaica, bem como por advogados que trabalhavam na Justiça Militar e suas equipes. Foi executado entre 1979 e 1985, durante o final da ditadura militar.
O Projeto consistiu em copiar e produzir relatórios e um livro designado “Brasil: Nunca Mais”, cujo objeto é um conjunto de quase mil páginas de processos judiciais contra presos políticos. Hoje o material encontra-se digitalizado, concretizando o Projeto Brasil: Nunca Mais Digital.
O Mandato e as competências da CNV
Conforme a Lei 12.528/2011, que instituiu a CNV, após ampla discussão no Congresso Nacional, o mandato de seus membros seria de 2 anos. Nesta oportunidade a Presidente já concordou com uma prorrogação de 6 meses. Contudo, esta prorrogação ainda não foi aprovada pelo Congresso Nacional. Quanto à competência temporal da CNV, esta se refere ao período que vai de 18 de setembro de 1946 a 5 de outubro de 1988.
Com relação a sua competência material a Comissão Nacional da Verdade tem como objetivos esclarecer os fatos e as circunstâncias das graves violações de direitos , promover o esclarecimento circunstanciado dos casos, de torturas, mortes, desaparecimentos forçados, ocultação de cadáveres e sua autoria, ainda que ocorridas no exterior, identificar e tornar públicos as estruturas, os locais, as instituições e as circunstâncias, encaminhar aos órgãos públicos competentes toda e qualquer informação obtida que possa auxiliar na localização e identificação de corpos e restos mortais de desaparecidos políticos, colaborar com todas as instâncias do poder público para apuração de violação de direitos humanos, recomendar a adoção de medidas e políticas públicas, promover, com base nos informes obtidos, a reconstrução da história e prestar “assistência às vítimas. A competência material da CNV tem foco, portanto, nas graves violações.
Ressalte-se, também, que a Comissão Nacional da Verdade não tem poderes para punir (incompetência que é comum em comissões da verdade), nem para indenizar pois no Brasil existe uma comissão específica com o fim de promover reparações materiais, a Comissão da Anistia.
Quanto ao perfil dos comissários, ou comissionados, a Presidente procurou formar uma Comissão representativa de diferentes forças e segmentos políticos e profissionais do país, em suas palavras, uma Comissão de Estado. A própria lei que criava a Comissão, exigia que seus membros fossem brasileiros identificados com a defesa da democracia e da institucionalidade constitucional, bem como com o respeito aos direitos humanos.
Selecionou, então, a Presidente Dilma três membros articulados com a política e a máquina burocrática dos partidos de oposição (Paulo Sérgio Pinheiro, José Carlos Dias e José Paulo Cavalcanti), três membros afinados com a política do governo em curso (Claudio Fonteles, Maria Rita Kehl e Rosa Cardoso da Cunha),e um Ministro integrante do Superior Tribunal de Justiça, há muitos anos integrado ao Poder Judiciário, mas distanciado da militância política e partidária.
Ao mesmo tempo, apesar de uma dominante formação jurídica, estes membros tinham diferente inserção profissional: José Carlos Dias e Rosa Cardoso eram e são advogados e o foram de presos políticos nos tempos de ditadura (a última é também professora aposentada de uma universidade federal); José Paulo Cavalcanti é advogado de empresas e escritor; Paulo Sérgio Pinheiro é bacharel, professor da Universidade de São Paulo e representa o país no exterior em missões relacionadas a questões de direitos humanos; Gilson Dipp é Ministro e Vice-Presidente do Superior Tribunal de Justiça; Cláudio Fonteles é ex-Procurador da República e Maria Rita Kehl é jornalista e psicanalista.
No primeiro semestre de 2013 o ministro Gilson Dipp afastou-se da CNV por motivo de saúde. Posteriormente Cláudio Fontelles renunciou. Recentemente, desde 03 de setembro deste ano, passou a integrar a comissão o jurista Pedro Dallari, com formação em direito constitucional e internacional.
Note-se que a diferente extração política e idológica dos membros da CNV, além de expressar os valores do pluralismo, pretendia tornar mais verossímeis e menos contestadas as verdades por ela enunciadas. Entretanto, imporia uma difícil harmonização de perspectivas, ou como se convencionou chamar no âmbito da CNV, uma conciliação de metodologias entre os membros.
As atividades da CNV
A Comissão foi instalada sem que houvesse um período anterior dedicado a discussões sobre o conteúdo do mandato, sem a elaboração de um plano de trabalho ou a formação de uma equipe que pudesse assessorá-la adequadamente. Alguns dos membros se conheceram durante a cerimônia de posse. Sendo assim não houve algo como o nivelamento anterior do conhecimento de seus membros ou a capacitação prévia dos assessores.
Durante 6 meses a CNV esteve discutindo seu regimento e organização interna, a composição de sua assessoria, as parcerias a serem realizadas, o escopo de seu trabalho. O que se conseguiu gerar neste período foi um plano de organização interna, que criava no interior da comissão subcomissões e grupos temáticos de trabalho.
As Subcomissões criadas versavam sobre 1)“ Pesquisa, Geração e Sistematização de Informações”, dentro da qual situam-se os grupos de trabalho; 2) “Relações com a Sociedade Civil e Instituições”, onde deviam ser programadas e articuladas as Audiências Públicas e 3) “Subcomissão de Comunicação Externa”, onde foram construídas e são disponibilizadas diferentes ferramentas para o relacionamento com o público, ou seja, o sítio web institucional, a Ouvidoria da CNV e as redes sociais da CNV que permitem interação via facebook, twitter e You tube.
Quanto aos grupos temáticos, eles foram ampliados no curso do mandato dos comissionados e se referem a eventos políticos relacionados à repressão ou à resistência , a tipos de vítimas de violações de direitos ou ao funcionamento de órgãos ou de instituições sob o regime ditatorial. São, atualmente, treze: Araguaia; Contextualização, fundamentos e razões do Golpe Civil-Militar de 1964; Ditadura e gênero; Ditadura e sistema de Justiça; Ditadura e repressão aos trabalhadores e ao movimento sindical; Estrutura de repressão; Mortos e desaparecidos políticos; Graves violações de Direitos Humanos no campo e contra indígenas; Operação Condor; O Estado ditatorial-militar; Papel das igrejas durante a ditadura; Perseguição a militares; Violações de Direitos Humanos de brasileiros no exterior e de estrangeiros no Brasil.
Em abril de 2013, estes Grupos de Trabalho concluíram a atualização de seus respectivos cronogramas de trabalho. Recentemente, apresentaram resultados preliminares de pesquisa e das principais atividades desenvolvidas. Encontram-se, contudo, distantes de resultados conclusivos.
Relativamente à questão de dar voz às vítimas e testemunhas de violações de direitos, bem como ouvir perpetradores recorde-se que até esta oportunidade foram tomados 460 Depoimentos pela CNV, sendo 200 (43%) em sessões reservadas e 260 (57%) em sessões abertas ao público. Estes depoimentos foram contabilizados segundo as categorias de agentes públicos, colaboradores, vítimas civis, vítimas militares e testemunhas.
Registre-se, também, que neste primeiro ano de trabalho a assessoria da CNV foi integrada por 34 (trinta e quatro) assessores, entre ocupantes de cargos em comissão e servidores requisitados ou cedidos por outros órgãos da administração pública, 12 (doze) estagiários da Presidência da República e 7 (sete) consultores, que colaboram diretamente com a CNV e são financiados com recursos próprios de agência de cooperação internacional. Foram, ainda, contratados, até 1º de agosto de 2013, no âmbito de projeto de fomento à pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais, 23 (vinte e três) pesquisadores que integraram Grupos de Trabalho ou colaboraram com a CNV.
Expectativas da Sociedade Brasileira em relação ao trabalho da CNV
A criação da Comissão Nacional da Verdade emulou o surgimento de um expressivo número de comissões da verdade, tanto no âmbito do poder público quanto no da sociedade civil. Hoje temos notícia de que foram criadas aproximadamente 100 comissões, contando-se as estaduais, as municipais, as de entidades, centrais sindicais, sindicatos, universidades e as temáticas. Além disto se constituíram ou ativaram numerosos outros grupos, que adotaram a forma de comitês, coletivos ou fóruns, visando lutar por uma justiça de transição em que se concretizem os direitos à memória, à verdade e à justiça.
Em recente atividade de monitoramento das atividades da Comissão Nacional da Verdade uma ONG intitulada Instituto de Estudos da Religião- ISER, em projeto financiado pela Fundação Ford, identificou 35 grupos desta natureza em 27 Estados da Federação, alguns deles articulando vários subgrupos. O ISER relacionou, ainda, diferentes grupos constituídos nos Estados sob a designação de Tortura Nunca Mais , Núcleos de Pesquisa, ONGs, Comissões de Familiares, de Mortos e Desaparecidos Políticos e outras entidades que apresentavam trajetória na área de direitos humanos. Utilizando uma metodologia de trabalho que incluía a apresentação de sua pesquisa aos destinatários, bem como o uso de questionários, o Instituto pôde concluir que as expectativas deste público sobre o trabalho e funcionamento de nossa comissão da verdade eram as seguintes:
1) O esclarecimento público dos fatos;
2) A produção de Justiça, reparação, judicialização dos casos e responsabilização dos perpetradores de violações;
3) A contribuição para o debate público e a construção da história;
4) O desenvolvimento de um processo metodológico consistente da investigação;
5) Transformações na sociedade contemporânea.
Relativamente ao esclarecimento público dos fatos as análises das respostas apresentadas indicaram como questões fundamentais para a investigação e elucidação às atinentes aos mortos e desaparecidos políticos, às torturas, às circunstâncias e locais de ocultação de pessoas ou cadáveres, aos antecedentes do Golpe de 1964, à intervenção sobre a Amazônia, à Guerrilha do Araguaia, à estrutura fundiária, à violência estatal e à impunidade, à questão indígena e crimes seletivos contra lideranças, aos padrões de violações de direitos humanos e aos crimes da ditadura, a casos emblemáticos, ao período de 1964 a 1985, aos arquivos fechados, em especial, os das Forças Armadas que até o momento a sociedade não teve acesso.
Estas respostas não surpreendem: vítimas, familiares, militantes de direitos humanos, integrantes ou não dos coletivos mencionados, têm revelado grande convergência na priorização da investigação, discussão e esclarecimento público das designadas graves violações de direitos, havidas no Brasil. Eles as nominam textualmente ( mortes, desaparecimentos, torturas, ocultação de cadáveres) ou se referem aos eventos políticos, onde ocorreu o maior número de graves violações (Golpe de 1964, Guerrilha do Araguaia) ou ainda a problemas que ensejaram violência e impunidade dos perpetradores como a estrutura fundiária e a intervenção sobre a Amazônia. Há também demandas por aprofundar-se a caracterização da violência ditatorial, mediante a discussão de padrões de violações de direitos humanos, crimes da ditadura, e casos emblemáticos. Ou a reiteração de que o período fundamental a ser pesquisado é o situado entre 1964 e 1985, ou seja, o da ditadura. Ou finalmente que temos que buscar informações sobre as graves violações nos arquivos fechados das Forças Armadas. Insista-se em que o foco é sempre as graves violações.
Desafios da CNV
São realmente desafiadoras as tarefas e o aprendizado que a Comissão ainda precisa realizar para cumprir o mandato que a lei lhe atribui. Confrontam os membros da Comissão da Verdade diferentes tipos de desafios: questões de natureza operativa, de método, de gestão, de eficiência, de dedicação etc.
Nesta interlocução desejo, entretanto, destacar três tipos de desafios de natureza teórico-conceitual a respeito da verdade que buscamos. No fundamental, como salientei, a lei 12.528/2011 é uma norma que acompanha as concepções contemporâneas do direito internacional dos direitos humanos acerca do conceito do direito à verdade e, particularmente, do processo designado como Justiça de Transição.
Estas concepções alargaram o conceito de verdade no âmbito do processo de Justiça de Transição e as atribuições de uma comissão da verdade.
Hoje, estudos e recomendações da ONU e de outras comissões internacionais revelam que o direito à verdade se perfaz com o direito à memória e o direito à justiça. Afirmam também que o direito à verdade é inderrogável e imprescritível em relação a todas as graves violações de direitos humanos, que configuram crimes de lesa humanidade.
O exercício do direito à verdade reclama, ao mesmo tempo, integral acesso à informação, a abertura de arquivos secretos, a existência de uma investigação eficaz, o pormenorizado conhecimento das circunstâncias e local em que a violação ocorreu, a identificação e nomeação dos perpetradores das violências e sua responsabilização.
Como tem sido reiterado por normas e cortes internacionais as anistias e auto anistias não podem servir de anteparo à punição de crimes de guerra, genocídios e crimes contra a humanidade, como são os assassinatos, a tortura, os desaparecimento forçados e a ocultação de cadáveres praticadas no Brasil.
Sendo assim, o primeiro desafio a ser vencido pela CNV, na plenitude de seu colegiado, é alcançar um efetivo ajustamento às concepções internacionais hoje vigentes relativamente à compreensão do direito à verdade.
O segundo desafio é entender a relação que uma comissão da verdade deve ter com vítimas e familiares. Não basta lhes dar voz, é preciso ouvir a sua voz, ouvir a sua experiência, ouvir a interpretação da dor física e moral que sofreram. Comissões da verdade devem sempre contrastar a análise dos contextos históricos e sociológicos que promovem com a perspectiva das vítimas. Devem fazer com que dar voz e ouvir as vítimas não seja um enunciado retórico, concretizando este posicionamento em seu trabalho cotidiano.
Por fim, o terceiro desafio para nossa comissão da verdade é a relação com a sociedade civil, implicando em transparência e compreensão do caráter pedagógico de nosso trabalho. Neste caso a transparência tem várias dimensões e se aplica a situações diferenciadas, ou seja, refere-se a dar publicidade às discussões e atividades da CNV, a permitir seu acompanhamento pelos interessados, a disponibilizar registros escritos de seu trabalho ou dos depoimentos que recolhe etc.
Parece, contudo, que a transparência deve estar desde logo associada à compreensão do caráter coletivo que a produção da verdade deve ter numa Comissão da Verdade.
Comissões da Verdade funcionam em sociedades partidas, política e ideologicamente, e precisam obter reconhecimento sobre o valor de seu trabalho e dos resultados que alcancem. Precisam criar laços com os diferentes grupos sociais (estudantes, jovens, mulheres, trabalhadores) e, em especial, uma densa relação com os movimentos sociais e os grupos interessados em seu trabalho. Não sendo assim as recomendações ou políticas públicas que propuserem não terão repercussão nem possibilidade de serem implementadas.
Últimas Reflexões
Comissões da Verdade, em um mundo assolado por crises econômicas, em países que tenham grandes parcelas da população na miséria, com altos níveis de desigualdade social são necessárias? São primordiais na construção da vida em sociedade?
Respondo que sim. Se a existência de um regime democrático, com a garantia dos direitos de expressão, reivindicação, de luta por melhores condições de vida, por segurança em relação à integridade corporal e à vida forem relevantes, a existência de comissões de verdade é prioritária.
Elas devem apresentar ao público de um país e do planeta a tragédia que pode suceder em uma sociedade sem democracia. Por isso comissões da verdade devem focalizar e contar minuciosa e claramente as graves violações do direito à vida e à integridade física que sucedem em sociedades sem democracia. Devem contar a imposição da dor, física e moral, extremas que ocorre nestas sociedades.
Este quadro de juízo final, com assassinatos, choques, queimaduras, empalamentos, estupros, açoitamentos, pauladas, tem ocorrido nas ditaduras. Precisamos rememorar e denunciar este quadro. A sociedade precisa saber que isto e muito mais ocorreu em nossos países: no Chile, na Argentina, no Brasil, e que pode voltar a ocorrer.
A maioria da população tem horror à desordem e em situações críticas apoia a imposição de uma ordem autoritária. Comissões da Verdade em 2013 devem recordar o Holocausto que a imposição de uma ordem autoritária e ditatorial provoca e, principalmente, propor a discussão de políticas sociais que reforcem a construção da democracia.
Rio, 23 de outubro de 2013
Rosa Maria Cardoso da Cunha
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nov 06 2013
Baltasar Garzón: “Quando as feridas do passado não são fechadas, os males voltam
GENEBRA – A Comissão da Verdade no Brasil não pode ser um substituto a ações penais na Justiça em relação aos crimes cometidos durante o regime militar. Quem faz o alerta é o espanhol Baltasar Garzon, que também alerta que a anistia não pode impedir que crimes como a tortura sejam investigados.
Polêmico para muitos, corajoso e até heroi para outros, Garzon foi destituído de seu cargo de juiz na Espanha ao tentar investigar os crimes do franquismo. Fez história aopedir a prisão do general Augusto Pinochet, abriu casos contra terroristas do ETA e tocou em alguns dos temas mais delicados da política espanhola, ganhando um status
de estrela mundial. Agora, defende a Julian Assange, da conselhos a diversos governos latino-americanos e percorre o mundo defendendo que a Justiça seja feita emrelação a ditadores e regimes não-democráticos.
Nesta semana, ele está em Genebra para reuniões na ONU que avaliará o caso dos desaparecidos na Espanha e na Argentina. Entre um encontro e outro, conversou comum grupo reduzido de jornalistas, entre eles o Estado. Eis os principais trechos da entrevista:
P – Que papel pode de fato ter a Comissão da Verdade hoje no Brasil?
Garzón – O fato de que se está pedindo essa comissão e que existam resoluções mostram a atualidade do fenômeno. Os únicos que negam a atualidade do fenômeno são aqueles envolvidos e aqueles que os protegem. É sempre a mesma coisa. Quando se alega que há risco para a integridade, para a soberania, para a democracia, são
sempre o mesmo grupo de pessoas. porque teme que seu status quo seja alterado. Mas o que está demonstrado é que, por meio de uma comissão da Verdade, nunca que rompe uma democracia, e sim que se consolida. A força da justiça democrática é o que tem de mudar isso. Uma justiça cúmplice e submetida a esses poderes sempre vai
evitar que se avance. O importante é conseguir que esse segmento coopere.
P – No Brasil não ha uma cooperação do segmentos do setor militar.
Garzón – Claro. Sequer aceitam que atuaram de forma errada.
P – Pode haver Justiça com a manutenção da lei de anistia?
Garzón – A anistia pode ser mantida, mas sempre que ela não se aplique a casos de lesa humanidade. Isso deveria estar claro nas mentes das pessoas. No caso de Araguaia a Corte Interamericana foi clara em 2010 ao dizer que a lei de anistia do Brasil é nula nesse caso e que existe a necessidade de investigar.
P – Quais são os obstáculos para o trabalho da Comissão da Verdade no Brasil?
Garzón – Precisa haver uma coordenação entre a comissão federal e as comissões locais. É muito bom que existam essas comissões locais, e não apenas uma de notáveis. Mas deve haver uma coordenação. Outro problema das comissões no Brasil é de que não há uma obrigação de presença de alguém que tenha sido convocado e
nem a obrigação de declarar. Sanções deveriam ser colocadas se isso não for cumprido.
P – Esse exercício no Brasil é suficiente para garantir uma Justiça?
Garzón – A Comissão da Verdade deve ter um papel complementar e não é um substituto à Justiça Penal. A criação de uma comissão não acaba com a obrigação de que se investigue um crime. Por isso digo que as comissões precisam complementar e não substituir a uma ação penal. Precisa haver uma investigação eficaz e independente.
No caso do Brasil, o Supremo decidiu não atender a isso. Mas abriu o espaço para a comissão. Enquanto isso, estamos vendo procuradores estaduais iniciando casos, o que pode levar a um reconhecimento da justiça penal. No Brasil, há um longo caminho ainda a ser percorrido, Mas as coisas avançam.
P – Como o sr. considera o tratamento que governos latino-americanos estão dando ao seu passado militar?
Garzón – A Argentina sem dúvida é onde as investigações mais estão ocorrendo. No Chile, as penas aplicadas são muito suaves. O Uruguai vive algumas contradições.Mas também estamos vendo uma cooperação cada vez maior entre Brasil, Argentina, Chile, Bolivia e esperamos Paraguai para investigar de forma conjunta o que ocorreu no
Operação Condor. Já estamos trabalhando nisso e vamos avançar.
P – Porque os crimes do Franquismo até hoje não foram julgados na Espanha?
Garzón – Lamentavelmente, o Franquismo ainda está vivo em algumas partes da Espanha. Em algumas pequenas cidades, falar ainda da Guerra Civil e saber quem matou a quem pode ser um problema. A realidade é que existe uma impunidade dos crimes franquistas até o dia de hoje. O único estudo realizado sobre o assunto ocorreu por
minha ordem e aponta que entre 136 mil e 152 mil civis desaparecidos. Depois de 75 anos, não ha nenhum estudo do estado espanhol. Ha uma impunidade evidente. O Tribunal Supremo impediu julgar o assunto e ao mesmo tempo não permitiu alternativa, nem como memória histórica ou a criação de uma comissão da verdade. Ou seja,
devemos ser o único país da Europa e um dos poucos países democráticos do mundo que não fez nada pelas vitimas. Nesse sentido, a sociedade civil espanhol estamos insistindo na necessidade de que o governo tome a iniciativa para impulsionar uma comissão da verdade para que não passe mais tempo e a vitimas, com idade já mais
avançada, possam pelo menos contar seus casos e esperem respostas.
P – Como o estado espanhol tem reagido a essa ausência de uma resposta?
Garzón – Não existe um compromisso do estado. Hoje, as exumações feitas das vítimas ocorrem em condições deprimentes, com dinheiro das famílias. Por falta de dinheiro, das 129 vitimas exumadas, só 12 puderam ser identificados por que o estado diz que não há dinheiro para fazer teste de ADN. O orçamento para isso hoje é zero.
Mas também queremos uma investigação dos casos conhecidos internacionalmente das 30 mil crianças roubadas pelo regime de Franco, entre 1937 e 1951. Ao final da Guerra Civil, elas foram retiradas de suas famílias republicanas apenas por serem republicanos e entregues a famílias adeptas aos regime. Isso não foi reconhecido.
Centenas de sequestros foram feitos nos hospitais com a ajuda de médicos, enfermeiros, religiosos.
P – Desde o fim da ditadura, vários governos socialistas já assumiram o poder na Espanha e nem assim a investigação avançou. Porque?
Garzón – A razão evidente é que o franquismo durou 40 anos e tem um peso demasiado forte nas consciências das pessoas e das instituições. Impregnava tudo. Na transição para a democracia, optou-se por um continuismo com a visão europeista primando sobre o que tinha ocorrido. A tese era de que franquismo ficou para tras e que
a convivência chegaria. Isso foi não apenas um erro de perspectiva. Mas também um erro político. Quando as feridas não são limpas e fechadas, os males voltam. O que ocorre na Espanha hoje tem relação direta com o fato de que não soubemos resolver no momento. Em El Salvador, no caso Pinochet, na Argentina. Esses casos levaram o
direito adiante. Na Espanha, o discurso é de auto-proteção, de que aqui as coisas são diferentes e que já está superado e deixamos de lado 152 mil pessoas.
P – O estado diz que as vítimas pouco fizeram para buscar Justiça depois da queda do regime.
Garzón – As vítimas, por esse medo que penetra os ossos, só em 2000 começaram a se organizar. Mas essa não é uma tarefa das vítimas. É do estado. E a crença que o estado quer que se acredite é que já está tudo sanado. O esquecimento imposto é falso. O estado nunca fez nada. o grau de cinismo de alguns espanhóis é altíssimo e,
depois de 75 anos, é tempo suficiente para que os espanhóis possamos assumir que algo se fez de mal.
P – O sr. sente que há uma resistência também da parte da opinião pública espanhola?
Garzón – A imprensa de extrema direta e de direitas saltaram sobre nós como se estivéssemos no ano 1933. Quando parecia que eu iria começar a investigar esses casos, começaram um ataque brutal, pessoal e profissional, contra minha pessoa. As pessoas me diziam que eu iria romper a Espanha, que eu era a vergonha internacional. Era
triste de ver o cinismo dessas pessoas. Me chamaram de comunista, terrorista. Lembro-me uma vez num restaurante, um senhor veio me dizer que eu estava alterando a estabilidade da pátria. Há uma parte da direita que até hoje não assume que houve um crime. Muitos me disseram: aqui não é a Argentina. Vale lembrar que, na transição
para a democracia, não se tomou na Igreja, no poder econômico e no poder judicial. Os símbolos fascistas continuam nas ruas de Madri.
P – Seu esforço para investigar esses crimes levou o sr. a perder seu cargo de juiz. Como se sente?
Garzón – Eu teria feito tudo de novo. Não me arrependo.
P – O sr. temeu por sua vida em algum momento?
Garzón – Não sei. Mas o fato é de que é muito chato ter suas contas rastreadas para que uma mentira seja fabricada. É muito chato andar com proteção, ter sua casa
invadida duas vezes, ter sido colocado sob escuta. Mas fui eu que optei por fazer isso.
P – O sr. é o advogado de Julian Assange. Isso o afetou já de alguma forma profissionalmente?
Garzón – Sim. Eu era um dos consultores na OEA em relação ao conflito colombiano e, por pressão dos EUA, tive de deixar o cargo. Washington impôs minha saída.
P – Como o sr avalia o que ocorre com Assange?
Garzón – Instrumentou-se um processo na Suécia como mera justificativa para promover sua entrega para os EUA, com fatos relacionados com a liberdade de informação.
Isso tudo por ter recolhido e distribuído informação, da mesma forma que outros meios de comunicação fizeram e não os molestaram.
P – O sr. defenderia Edward Snowden?
Garzón – Isso me foi proposto. Mas enquanto eu defenda Assange, dificilmente poderia assumir esses outro caso. Além disso, não sei o que eu poderia contribuir. São
defesas distintas. Mas, claro, defendi o fato de que é inaceitável que haja essa penetração da intimidade em instituições, pessoas que os EUA estão fazendo na maior das
impunidades. É muito triste que isso ocorra e assumido por muitos como algo normal, sem uma reação mais forte contra esse sistema de invasão massiva. De alguma
forma, é a morte da defesa da democracia de alguma forma. Não aceito o argumento de Obama sobre a necessidade disso. Há milhares de formas diferentes de usar o
serviço de inteligência. Onde estamos?
P – Como o sr. avalia o comportamento da Europa diante disso?
Garzón – Muito tímida. Foi vergonhoso o que ocorreu com o avião de Evo Morales. Eu repúdio a atitude dos países europeus. Jamais teriam feito com Obama, Rajoy ou
Merkel. Isso mostrou o menosprezo que eles tem. Foi uma humilhação que foi feita. isso mostra que estamos nas mãos de que tem a batuta.
Fonte- Blog do Jamil Chade
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nov 06 2013
Brasil discute Justiça de transição pelo Institute for Global Law, Justice, and Policy da New York School of Law
Para quem estiver nos Estados Unidos em meados de novembro e tiver possibilidade de participar, uma boa programação é o debate sobre o papel da anistia na justiça de transição brasileira, promovido pelo Institute for Global Law, Justice, and Policy da New York School of Law, e pelo grupo de interesse sobre justiça de transição e estado de direito da American Society of International Law. Participam do debate a professora Ruti Teitel e o Sr. Marcelo Torelly, que até recentemente atuou na Comissão de Anistia do Ministério da Justiça e nos traz o convte.
Segue abaixo algumas informações uteis.
Brazil’s Reckoning with Transitional Justice:
Understanding the Role of Amnesty
A Conversation with Brazilian Transitional Justice Expert Marcelo D. Torelly
Chaired by Professor Ruti Teitel
Cosponsored by the NYLS Institute for Global Law, Justice, & Policy and the ASIL Transitional Justice and Rule of Law Interest Group
Please join the Transitional Justice Network for a conversation with Brazilian Transitional Justice Expert Marcelo D. Torelly about Brazil’s amnesty dilemma for dictatorship-era criminals.
The goal of the Transitional Justice Network is to promote global discourse among students, scholars, and professionals on issues of transitional justice. A place for discussion, where students can learn about issues in the field, scholars can link with other scholars working in similar areas, and professionals can keep up to date with trending thoughts and philosophies. http://www.transitional-justice.org/
Marcelo D. Torelly is currently a visiting researcher at the Institute for Global Law and Policy at Harvard Law School. He has been Advisor, Brazilian Ministry of Justice on Transitional Justice issues, as well as Manager, Transitional Justice Exchange and Development Program, and has taught theory and philosophy of law at Brasilia Catholic University.
Ruti Teitel is the Ernst C. Stiefel Professor of Comparative Law, New York Law School.
When:
November 14, 2013
6:15 p.m. – 8 p.m.
Where:
New York Law School
185 West Broadway
(corner of Leonard Street)
Boardroom, W204 (2nd Floor)
New York, NY 10013
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nov 01 2013
Vagas para pesquisadores na Comissão Nacional da Verdade

A Comissão Nacional da Verdade (CNV), por meio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), está selecionando pesquisadores.
Conheça os editais:
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nov 01 2013
Prorrogado prazo para solicitação de espaço de acampamento no Fórum Mundial de Direitos Humanos até 04/11/2013
Prorrogado prazo para solicitação de espaço de acampamento no Fórum Mundial de Direitos Humanos até 04/11/2013
Foi prorrogado o prazo para pré-inscrições até o dia 4 de novembro para a ocupação de vagas no Acampamento do Fórum Mundial de Direitos Humanos (FMDH), que será montado no Pavilhão do Parque da Cidade Sarah Kubitscheck (Brasília-DF), no período de 9 a 14 de dezembro.
Os participantes do FMDH interessados em se hospedar no acampamento deverão contribuir com o valor de R$55,00 – o que lhes dará o direito de ocupar uma vaga de 2x2m, ou o correspondente a uma barraca para duas pessoas. O valor será o mesmo, não importando a quantidade de dias de permanência.
Mais informações e formulário de pré-inscrições: Clique aqui
Hospedagem em hotéis
Além disso, a organização do Fórum Mundial de Direitos Humanos fez contato com diversos hotéis de Brasília para buscar melhores tarifas de hospedagem para os participantes do FMDH. Essa proposta visa ampliar o acesso ao Fórum e segue em negociação com o objetivo de aumentar a lista de hotéis parceiros.
Acesse a lista de hotéis parceiros do FMDH: Clique aqui.
Além destes, outros hotéis da cidade também podem estar disponíveis no período do Fórum. Caso não encontre uma opção desejável entre os hotéis parceiros, verifique e acesse a lista geral de hotéis de Brasília:Clique aqui.
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