Democracia violada: Golpe de 1964, Golpe de 2016

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Na última sexta-feira, 12 de agosto de 2016, membros da Comissão Estadual da Verdade do Paraná e integrantes do Fórum Paranaense de Resgate da Verdade, Memória e Justiça participaram de debate Democracia Violada: Golpe de 1964, Golpe de 2016. O evento, ocorrido na Sala da Memória da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná fez parte da programação do Circo da Democracia, instalado na Praça Santos Andrade, defronte ao prédio histórico da universidade onde funciona a citada faculdade.

Participaram do debate Andréa do Rocio Caldas, Daniel Godoy, Ivete Caribé da Rocha, Milton Alves, Narciso Pires e Vera Karan.

As apresentações dos integrantes da mesa chamaram a atenção para a similaridade histórica entre os fatos e atores políticos, sociais e econômicos que  concorreram e participaram ativamente do Golpe de 1964 e os eventos ocorridos recentemente no Brasil, fazendo revisitar um passado de triste memória da história brasileira em que o processo de ruptura com a democracia e de instalação de um regime autoritário civil-militar mergulhou o país num período de 21 anos de graves violações dos direitos humanos, no qual a supressão da liberdade, as perseguições, prisões ilegais, torturas e extermínio de civis em nome da segurança nacional eram o cotidiano de uma nação subjugada e amedrontada pelo terror de estado.

Destacaram os palestrantes que um dos grandes desafios ainda não superados diz respeito a como lidar com o legado da ditadura de 1964 que ressurgiu, principalmente a partir de 2015 em movimentos de rua, em projetos de lei no Congresso Nacional e em decisões dos demais poderes e que surpreendem a nação pelos conteúdos de evidenciam movimentos similares aos de 1964 de afastamento dos princípios democráticos consagrados na Constituição Cidadã de 1988.

Dentre estes movimentos, chama a atenção a proposta que vem sendo denominada “escola sem partido”, tema tratado pela professora do Setor de Educação da UFPR, Andréa Caldas e que revive o desejo dos governos militares (sobretudo a partir da Lei Suplicy, do Ato Institucional nº 5  e das reformas  do ensino que se sucederam) de impedir que a juventude brasileira pudesse ter acesso a toda a diversidade de conhecimentos produzidos pela humanidade em milhares de anos sob o argumento de que certos saberes tinham caráter subversivo e atentavam contra a paz social e à segurança nacional.

O Relatório da Comissão Nacional da Verdade contém  um Texto Temático intitulado “Violações de direitos humanos na universidade” que é significativo para se entender o que significa a supressão da liberdade de ensino e a imposição de uma visão única sobre a formação das gerações futuras.

O pré-relatório da Comissão Estadual da Verdade do Paraná – CEV-PR, disponível neste site contém três casos singulares e que exemplificam com materialidade o que significa a supressão da liberdade nas escolas e universidades. O primeiro trata do caso da professora primária Clarice Valença, de Londrina/PR, presa em sala de aula na frente dos alunos, acusada de subversão e integrar grupo de Carlos Marighella. A acusação era falsa, mas os meses de prisão e torturas deixaram como sequela a perda total da visão de uma vista e a perda quase completa da outra, além de anos de perseguição e o impedimento de que a mesma pudesse integrar o quadro do magistério estadual, apesar de aprovada em concurso público duas vezes. O segundo caso se refere ao professor pesquisador do curso de medicina da Universidade Estadual de Londrina, Tsutomu Higashi, acusado de subversivo e demitido injustamente, foi perseguido por anos e impedido de ser contratado em concursos públicos subsequentes. Higashi foi apenas um de dezenas de docentes e centenas de alunos daquela universidade que foram intensamente perseguidos pela ditadura civil-militar e tiveram suas vidas e seus futuros violados em todos os sentidos. O terceiro caso versa sobre Jane Argolo, estudante da Universidade Federal do Paraná, participante do DCE (Diretório Central dos Estudantes) e da UPE (União Paranaense dos Estudantes), integrou os protestos contra o fechamento do DCE pela Reitoria à época e do congresso na Chácara do Alemão. Foi presa, torturada com extrema violência e quase morreu na tortura. Viveu na clandestinidade por anos. A materialidade comprovada de seu crime foi possuir uma pasta com alguns textos de opinião e outros de autores considerados subversivos e proibidos  nas universidades. O que os três casos tem um comum? A repressão e a violência sobre professores e alunos que atingiu indistintamente a todos, fossem ou não pessoas de posição contrárias ao regime de exceção. Todos eram potencialmente inimigos do Estado e todos serviram ao propósito de servir como exemplos para impor o medo e o terror sobre todos aqueles que ousassem ensinar, aprender ou pensar o que não estava permitido.

O Relatório Final da CEV-PR está em fase de fechamento e deverá ser entregue em dezembro próximo.

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