À Teresa Urban, por Ivete Caribé da Rocha

À Teresa Urban:

Teresa não era só a companheira de lutas e amiga amorosa de qualquer hora. Era sobretudo, a referência ética, política e a força para seguir nossas lutas.

Guardo uma lembrança marcante de sua personalidade. Teresa era doce e meiga com os jovens e as crianças, os humildes e injustiçados e sabia ser muito dura com os arrogantes. Isso ficou bem claro naquela carta pública que escreveu a um jovem morador do bairro Uberaba, torturado por engano pela Policia Militar, que me permito citar alguns trechos:

“….

Por essas coisas todas – e porque você tem a idade de meu neto – quero te contar uma história (coisa que as avós adoram fazer).
Em 1972, fui presa e levada para a Delegacia de Vigilância e Captura (não sei se ainda existe). Ficava na Rua Barão do Rio Branco, onde depois foi instalado o Museu da Imagem e do Som e durante muito tempo imaginei se os sons e as imagens guardadas nesse museu eram os das celas que ficavam na parte de trás do prédio.

Fui colocada na cela com umas 20 mulheres. Todas nuas, amontoadas. Havia também uma garota muito jovem. O que elas tinham feito? Vadiagem e atentado ao pudor, me explicaram. Eram prostitutas que, dia sim, dia não, eram detidas durante a madrugada e soltas no final da tarde. De tempos em tempos, os policiais jogavam água dentro da cela, segundo eles, para esfriar os ânimos.

A mangueira era grande como as usadas pelos bombeiros, e o jato feria a pele. Quanto mais as mulheres gritavam, mais forte era o jato. Quando a situação ficava insuportável, elas ofereciam a menina aos policiais, garantindo que era virgem. Mesmo com todo aguaceiro, o calor era insuportável e quando pediam água, os policiais traziam um balde e um caneco. Antes de entregá-lo às mulheres, urinavam dentro.

Já tinha visto e sofrido maus tratos – afinal, eu era presa política – mas foi ali que compreendi que a tortura praticada nos quartéis durante a ditadura militar era só um prolongamento do que acontecia diariamente nas delegacias deste país. É verdade que o regime militar facilitou as coisas porque, se os homens fortes do pais permitiam a tortura, a morte e faziam desaparecer quem ousava levantar a voz, então “liberou geral”. Por isso, ninguém temia ser censurado ou punido por isso.

Sem responder a essas questões e punir quem fez, quem viu, quem permitiu, quem se calou, não há política de segurança possível. Precisamos construir uma nova história. Para “congelar o crime” é preciso saber quem são os criminosos e a primeira lição básica está na própria Constituição Federal: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.”

 

Acho que não preciso dizer mais nada, a não ser que você querida Teresa, está presente no mais profundo de meus ideais e nos meus pensamentos diários.

Até um dia querida Teresa.

Ivete Caribé da  Rocha

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