Lançamento Regional do Fórum Mundial de Direitos Humanos no Rio Grande do Sul

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Leia abaixo a a manifestação  de Chris Rondon em representação das 47 entidades que compõe o Comitê Organizador do Sul, incluindo o Fórum Paranaense de Resgate da Verdade, Memória e Justiçal, por ocasião do lançamento regional do Fórum Mundial dos DDHH nesta segunda-feira (02/09), no Palácio Piratini, em Porto Alegre.

 

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CARTA DO COMITÊ DE MOBILIZAÇÃO RS PARA O FÓRUM MUNDIAL DE DIREITOS HUMANOS

A ideia de realização de um Fórum Social Mundial de Direitos Humanos, evento que reunirá no mesmo espaço, sociedade civil, movimentos sociais e instituições públicas, surge num momento muito importante.

Muitos de nós, se não todos e todas, fizemos parte ou coro junto às reivindicações populares por melhorias na qualidade e nas condições de vida de brasileiros e brasileiras. Nestes episódios, ficou bastante nítido que o atendimento a esta complexa demanda exige que a democracia brasileira incorpore urgentemente novos valores, onde a marca a ser estabelecida é a cumplicidade entre as decisões de Estado e as necessidades do povo. O desenvolvimento econômico e social, perseguido à exaustão pelos governantes e forças produtivas, precisa estar combinado com inadiáveis avanços na prestação de serviços públicos, que são direitos de todas as pessoas, especialmente nas áreas da saúde e educação, pois as marcas das desigualdades sociais acumuladas ao longo de nossa história levarão ainda algum tempo para terem seus efeitos neutralizados.

Sendo assim, o fato deste fórum ser realizado em nosso país abre espaço para discussão a respeito da nossa própria realidade, além da participação expressiva das nossas organizações.

O comitê de mobilização do Rio Grande do Sul iniciou sua organização no dia 12 de agosto. Desde então realizou reuniões todas as segundas feiras, congregando mais de 40 entidades, instituições e organizações da sociedade civil, representando uma grande diversidade de frentes em que atuamos. Para nós, este ato sinaliza o “início” do processo do Fórum Mundial dos Direitos Humanos.Acreditamos que a partir desta data já estamos em “fórum” e a articulação das grandes conferências, das mesas redondas, dos grupos de trabalho, serão etapas que culminarão em Brasília, mas que lá também não devem se encerrar.

Temos imensa expectativa com a realização deste Fórum. Compartilhamos a ideia de que a pauta dos Direitos Humanos tem ocupado cada vez mais espaços e relevância, mas nem sempre com notícias boas. A esse respeito, lamentamos o fato de que boa parte de nossas energias ainda tenham que ser dirigidas ao acolhimento de vítimas de violência e violações, sem que tenhamos meios e muitas vezes canais adequados para somar esforços junto às instituições. A qualificação dos canais entre a ação da sociedade civil e poder público deve ser assumida como compromisso tangível, e nesse sentido, apontamos como caminho a valorização da Educação em – e para! – Direitos Humanos, meio pelo qual poderemos enfrentar corporações, preconceitos e tantos entraves conservadores que estigmatizam nossas temáticas, intimidam denúncias e mutilam memórias individuais e coletivas, às vezes pela violência física, às vezes pela simbólica.

Acreditamos que o Fórum Mundial dos Direitos Humanos é um espaço fecundo para discussão e reflexão, abarcando diferentes pontos de vista e, ao mesmo tempo, capaz de projetar uma agenda de cooperação. Um dos objetivos do nosso comitê, portanto, é a organização de espaços de diálogo e de encontro entre diferentes manifestações dirigidas à defesa dos Direitos Humanos.

Em nosso comitê, há aqueles e aquelas que lutam pelas liberdades religiosas, lado a lado com aqueles quem lutam pela prevalência de um estado laico; há quem trabalhe pelo direito à cidadania LGBTe há quem atue no atendimento às mulheres vítimas de violência; há quem atue pela valorização das entidades assistenciais junto às pessoas com deficiência e há também o poder público e suas instituições, como o CONADE e a FADERS. Nosso comitê é marcado pela diversidade, pois nele também há imensa preocupação com as populações em situação de rua, assim como também há quem atue pela integração do contingente imigrante, pois é visível o aumento de populações com estas características. No Rio Grande do Sul, a perspectiva desenvolvimentista também requer atenção, pois dela deriva também uma nova onda migratória, gerando novas demandas, além de um aumento significativo na pressão sobre os serviços públicos.

Também revelamos aqui neste ato, total sintonia com as pautas reivindicatórias das comunidadesquilombolas e indígenas, pois num país onde ainda viceja a desigualdade, são nestas temáticas que percebemos, muitas vezes, os efeitos reversos do tão almejado crescimento econômico. A posse da terra, tanto quanto a preservação de suas manifestações culturais, ainda requer maior atenção, bem como mecanismos institucionais dotados de poder e participação para que estas reivindicações sejam devidamente processadas. A mesma realidade, nesse sentido, também é compartilhada pela juventude negra, a mais discriminada e vitimizada entre os do “andar de baixo”.

As lutas mais atuais das organizações representadas no nosso comitê estão irmanadas com o conceito de “Memória, Verdade e Justiça”, que por sua vez não deve ser compreendido apenas como resgate de um passado “apagado”, mas especialmente pelo que isso significa no presente. A impunidade antiga estimula a violência estatal atual. A ocultação da verdade recria a cegueira social. O esquecimento da violência desarma a população ante o arbítrio contemporâneo.

A truculência das PM, a criminalização dos movimentos sociais, o famigerado “sistema” penitenciário, a tortura velada nas investigações,a cumplicidade corporativa das forças policias, e a leniência judicial, também se mantêm como heranças perversas que trazemos do regime de 1964 e se mostram de modo cruel na vida cotidiana como intolerância, preconceitos de raça, de gênero, de classe, de opção política, de bairro e orientação sexual.

Entre a tirania e a democracia, nossa “Justiça de Transição” segue incompleta, acobertando com a legalidade de hoje as perversidades de ontem, o que acaba por contaminar as esferas sociais com seu legado de dor, vergonha e medo. É preciso julgar, reparar e não repetir.

Nossa declaração segue como ilustração dos nossos desafios, e estes desafios não são novos, e dado que não são novos, precisam ter contrapartidas renovadas, permeadas pela democracia,  pela valorização e não criminalização das nossas lutas.

 

Porto Alegre, 02 de setembro de 2013

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Fonte: COMITÊ CARLOS DE RÉ

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